Espírito de Lenine continuou sendo transmitido no Ocidente e atiça toda espécie de inversão de valores. |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
No último dia 22 de abril Vladimir Putin deveria ter sido consagrado como líder mono-árquico de um “czarismo” moderno ainda mais despótico, agravado por uma ditadura vitalícia como não foi sequer a de seu sanguinário xará.
O COVID-19 o obrigou a adiar a entronização ilegítima, que deveria ser legitimada por um referendo falseado.
A data foi cuidadosamente escolhida, porque foi num 22 de abril, há 150 anos, que nasceu Vladimir Ilyich Lenin, o fundador da União Soviética e responsável por uma enormidade de crimes contra o sofrido povo russo e o mundo.
Lenin foi o organizador e criador da tática mais mortífera que a Terra gerou, da estratégia inspiradora das atrocidades modernas oriundas do comunismo soviético.
A influência de Lenin se projeta ainda hoje, segundo a jornalista Karina Mariani, do “La Prensa” de Buenos Aires.
Sua realização — a ditadura do proletariado marxista — continua avançando em ziguezagues e metamorfoses, com a determinação que exigia o Vladimir fundador, apesar de derrotas e crises.
O pesadelo comunista atormenta não apenas alguns países, mas reina no coração de intelectuais e políticos das democracias ocidentais.
Suas doutrinas são ensinadas em universidades de todo o mundo e fazem parte dos manuais que formam milhões de alunos.
No cinema, nas redes sociais e na mídia de massa mundial, ele continua presente.
A União Soviética criada pelo Vladimir cuja múmia é homenageada no Kremlin foi a grande indústria exportadora da morte, o flagelo que Nossa Senhora advertiu em Fátima que se abateria sobre o mundo se este não fizesse penitência.
Em 1º de fevereiro de 1920, Lenin escreveu a Trotsky: “A ração de pão deve ser reduzida para aqueles que não trabalham no setor de transportes, hoje decisivo”. Foi o início da fome maciça.
Milhões morreram de fome por ordem do pai do comunismo
A diretriz garantiu a eficácia da repressão: os populares ficaram proibidos de vender, comprar ou trocar seus produtos. Foi a consagração de um poder de vida e morte sobre os habitantes do mais extenso império do mundo — descreve Karina.
O terror que as vítimas nunca puderam esquecer começou a tomar forma pela mão de Lenin, autor do tutorial para a instalação das ditaduras comunistas.
Lenin ficava ofendido quando não se matava suficientemente. Em 29 de janeiro de 1920 — segundo a jornalista —, ele escreveu a Smirnov, chefe do Quinto Exército na região dos Urais:
“Fui informado de que há sabotagem e que os trabalhadores de Iyevsk estão no golpe.
“Estou surpreso que você se estabeleça e não prossiga com execuções em massa. Um bom comunista também é um bom chekista. Nós devemos dar exemplo.
“1) Pendure (e eu digo pendure [enforque] para que as pessoas vejam) nada menos que 100 kulaks (pequenos proprietários de terras), pessoas ricas, bebedores de sangue.
“2) Publique seus nomes.
Execuções em massa foram exigidas pelo igualitarismo nivelador leninista.
E no Ocidente, os intelectuais esquerdistas fingiam não ver ou aplaudiam.
“3) Pegue todos os seus grãos.
“4) Identifique os reféns como indicamos em nosso telegrama de ontem.
“Faça isso para que centenas de léguas de distância as pessoas vejam, tremam, descubram e digam: ‘Eles matam e continuam a matar kulaks sedentos de sangue’.
“Telegrafe confirmando que você recebeu as instruções. Seu. Lenin”.
Lenin não agiu sozinho: o mundo “progressista”, inclusive o mais culto da Europa e dos EUA, foi solidário com ele.
A intelligentsia mundial continuou a apoiá-lo na pessoa de Stalin e de seus sucessores, nos crimes em Cuba, no Camboja, na Venezuela ou na China.
Nos prelúdios revolucionários de fevereiro a outubro de 1917, as forças políticas não bolcheviques permitiram que os ‘movimentos sociais’ comunistas avançassem.
O golpe de Estado de outubro de 1917 durou até o final de 1991, e se ele caiu foi porque apodreceu de dentro para fora.
A malfadada Checa — Comissão Pan-Russa Extraordinária de Combate à Contrarrevolução e Sabotagem, criada em 7 de dezembro de 1917 para extinguir os dissidentes — foi a semente da KGB e da atual FSB. Lenin a colocou sob a direção de Felix Dzerjinsky.
Dzerjinsky: “os excessos são da própria natureza da revolução”
Trotsky escreveu dele:
“Sobre as repressões, Dzerjinsky era pessoalmente responsável por elas (...) estou preparado para reconhecer que a guerra civil não é uma escola de humanismo. (...)
“os 'excessos' são uma consequência da própria natureza da revolução que, por si só, constitui um 'excesso' da história” — cita ainda Karina.
A prosa trotskista continua válida até hoje, justificando atrocidades e os crimes da FSB putinista dentro e fora da Federação Russa.
Em todos os cantos em que o comunismo se impôs ou ainda domina, as liberdades políticas e econômicas foram removidas.
Partidos únicos e economias planejadas condenaram milhões de pessoas a uma fome feroz, à ditadura, ao terror e à morte.
A invasão da privacidade, a denúncia do vizinho, a censura e a espionagem foram as pilastras do sistema que, com adaptações, oprimiu quase um terço do mundo.
O “progresso” mundial comemorou a ascensão dos deserdados na Terra, e Lenin espalhou um igualitarismo e uma falsa solidariedade que não cresceram sem cessar sobre pirâmides de cadáveres e povos destruídos.
Hoje, intelectuais civis e eclesiásticos continuam impregnados total ou parcialmente da utopia assassina, louvando essa tentativa de empoderar os “deserdados na Terra” em congressos de movimentos sociais como os promovidos pelo próprio Vaticano.
As primeiras vítimas da Checa foram os kulaks — agropecuaristas da era czarista, condenados por se oporem ao roubo de suas propriedades.
Os sobreviventes, suas mulheres e filhos, ficaram reduzidos a comer raízes e cascas de árvores.
Silencia-se o universo de campos de trabalho forçado, ou persegue-se aos que querem falar deles |
Negou-se a existência dos campos nazistas até os mesmos ficarem evidentes no fim da II Guerra.
Mas as barbáries soviéticas permanecem intocadas como mausoléus do horror, veladas apenas por um pudico véu que esconde o orgulho dos assassinos em massa empossados pela ditadura do proletariado.
A elite do pensamento ocidental se calou, encobriu o “dano colateral”: afinal, não era esse o preço justificado para a construção do socialismo?
Muitos viam na URSS, como veem hoje na China, a potência que fundará a civilização do futuro.
E no Ocidente, até em cátedras eclesiásticas cantaram o fim do capitalismo consumista e a extinção da sociedade burguesa hedonista e decadente.
Se a URSS desabou — tendo mudado apenas de cor: adotou o verde ecológico —, sobrevive a utopia soviética da desconstrução de estruturas sociais e políticas para criar uma nova civilização.
Restou o sonho tóxico de criar de cima para baixo um homem novo e um mundo novo integrado à natureza, modelado pela eterna evolução da matéria.
A tribo amazônica passou a ser arquetipizada como a horda primigênia das cavernas descrita ebriamente por Karl Marx.
Não há nada de novo debaixo do sol; mudou tão-só a cor e o sobrenome dos Vladimir.
Essas metamorfoses foram previstas, fazem parte da evolução do magma material, única realidade e único deus válido e não espiritual dos homens que renegam qualquer divindade.
Em 1922, quando a sorte da Revolução corria perigo, Lenin insistia que os comunistas deviam mostrar flexibilidade a ponto de estarem dispostos a recomeçar do zero, suplantar a derrota e voltar a um novo assalto.
“O êxito dos êxitos foi o silêncio enigmático, desconcertante, espantoso e apocalipticamente trágico do Concílio Vaticano II a respeito do comunismo” (Plinio Corrêa de Oliveira) |
Embora em 1922 ele já estivesse gravemente paralisado, deu à luz a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, a URSS.
E morreu em 1924, escolhendo antes Stalin para continuar seu trabalho.
150 anos depois de seu nascimento, o comunismo continua sendo um pesadelo do qual a humanidade não despertou. E Putin quer recomeçá-lo.
As democracias se mantêm incompreensivelmente insensíveis diante dos crimes comunistas que não cessam, dos desesperados que boiam nas águas do Caribe para fugir de Cuba, dos tiros pelas costas daqueles que tentaram cruzar o Muro de Berlim, dos milhões mortos de fome no Holodomor ucraniano, nos Gulags da Sibéria. Nada as fazem mudar de ideia, conclui a jornalista.
Tamanho é o triunfo do fascínio tóxico de Lenin, que na presente crise global da pandemia vemos reemergir a redução das liberdades e a economia planejada, como teria feito o ‘velho’ Vladimir.
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