terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

Pandemia esvazia práctica católica
já minada no pós-concilio

Só um fiel na Catedral de Westminster, Londres
Só um fiel na Catedral de Westminster, Londres
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs








O Covid-19 impactou a prática da fé como uma telha que caísse sobre um altar de madeira carcomido a fundo pelo caruncho e provocando assustador desfazimento.

Na França, após a liberdade devolvida ao culto católico, abandonou a missa entre 15 e 30 % do minguadíssimo número que ainda assistia.

A decadência se inseriu na acentuada curva decadente do período pós-conciliar. Os que ainda comparecem apontam os mesmos fatores: indiferença abandono da catequese, dos sacramentos, fidelidade cambaleante, segundo o jornal “La Croix” porta-voz oficioso da Conferência Episcopal.

Em 1978 81% dos franceses se afirmava católica, hoje só 53%. Mas só o 4,5%, vai à missa, e só uma vez por mês! Declara cumprir o preceito dominical semanal apenas o 1,8%.

A enquete não diferencia entre rito ordinário e extraordinário, dando a impressão de ser o total dos comparecimentos.

Numa pandemia de tal maneira focada nos perigos da doença, no número de contágios e mortes, não era a hora dos fiéis tendo à sua testa, e massivamente o clero, invocarem fervorosamente os auxílios sobrenaturais que em dois milênios e com tanta eficácia afastaram as piores epidemias de um modo que ficou registrado para sempre em livros e monumentos?

Terá sido a “fumaça de Satanás” que invadiu os templos e afastou o corpo da igreja da sua fonte de salvação que encegueceu a fé e alimentou a obsessão sanitária materialista?

Pe. Giuseppe Corbari, párroco de Robbiano, celebra misa dominical para um monte de fotos
Pe. Giuseppe Corbari, párroco de Robbiano, celebra missa dominical para um monte de fotos
O jornal símbolo do catolicismo francês descreve seus apertos econômicos, esmolas e malabarismos para tampar as perdas e não fechar, sem sequer mencionar algum apelo ao sobrenatural.

O Episcopado chora agudas perdas nas esmolas: 40% a menos de um orçamento que só fazia diminuir na crise pós-conciliar, tratando do problema econômico como se Deus não estivesse ai e nunca tivesse socorrido fiéis e igrejas na necessidade. Cfr.: “La Croix”

Mas nem por esse argumento pecuniário, que os faz sofrer tanto, as igrejas deixaram de ser fechadas! 

O recurso a que recorrem em última instância são as subvenções dos órgãos públicos herdeiros da jacobina e anticristã Revolução Francesa! E que fornece auxílios, aliás, tacanhos que não cobrem as despesas e ordenados de funcionários.

Se há um santuário que Nossa Senhora em pessoa instituiu para curar os aflitos de todo mal e doenças, cujos milagres a ciência médica confirmou de modo estentóreo é o de Lourdes.

Mais de sete mil deles foram analisados com a lupa anos a fio por comissões de especialistas dotados dos melhores equipamentos que reconheceram curas inexplicáveis pela ciência.

Para não falarmos dos milhões de outros casos não analisados ou não declarados ao Bureau Medical de Lourdes. Quantas dezenas de milhões de fiéis foram a Lourdes a pedir a cura ou o consolo e voltaram se achando atendidos?

Mas, Lourdes, o santuário das curas, está quase deserto. O que houve? 

E os incontáveis altares, capelas ou grutas, réplicas da de Massabielle que há espalhadas no mundo inteiro onde se registraram alguns dos mais estonteantes milagres de Lourdes na Terra?

Ninguém na missa de Páscoa na Basílica de Aparecida. Arcebispo pediu que os fiéis sigam 'orientações dos médicos'
Ninguém na missa de Páscoa na Basílica de Aparecida.
Arcebispo pediu que os fiéis sigam 'orientações dos médicos'
Que fenômeno estranho aconteceu por onde os doentes, reais ou imaginários, não foram pedir a cura fulminante do Céu enquanto discutiam remédios e variantes de vacina?

Não é diferente em Aparecida: no ano 2020 acolheu 3.371.127 romeiros, segundo dados oficiais do Santuário Nacional, com uma diminuição de 75% em relação a 2019, quando foram registrados 11.963.635.

Desde 2014, a visitação anual à Basílica de Aparecida era igual ou superior a 12 milhões, sublinha a publicação do Santuário.

Para se ter ideia, de 1º de janeiro a 14 de março de 2020 1.546.322 devotos passaram pelo Santuário. Mas quando a doença atingia o auge o Santuário de Aparecida fechou. 

De 15 de março a 31 de dezembro, só compareceram 1.824.805 peregrinos. Em quase dez meses compareceu perto dos mesmos números dos dois primeiros meses do ano.

A diminuição de público em datas tradicionalmente movimentadas foi sensível: o 12 de outubro, Dia da Padroeira, apareceram por volta de 30 mil fiéis quando o ano anterior tinham sido mais de 160 mil.

A Igreja anglicana da Trindade ficou ainda mais vacia de fieles en Manhattan
Triunfo do ateísmo? A Igreja anglicana da Trindade em Manhattan
ficou ainda mais vazia de adeptos
A movimentação anual em 2020 foi a mesma das décadas de 60 e 70 do século passado.

Uma exceção ocupa um local de honra: a ponderável afluência de fiéis, em sua maioria casais jovens com muitos filhos, ao rito extraordinário da Missa – ou de São Pio V, ou simplesmente ‘missa em latim’ – sendo que eles antes da pandemia não o frequentavam.

Para essa dinâmica e fervorosa minoria tudo se passa como se a salvação se encontrasse na igreja de sempre. 

Puseram a velha modernidade carunchada de lado e com a paz na consciência foram as igrejas onde tem certeza ouvir a voz do Bom Pastor e onde aspiram ter a proteção de Nossa Senhora. 

Mas é preciso reconhecer que é um fenômeno minoritário.

Para muitos católicos o fechamento das igrejas resutou também de um grande processo anti-cristão
Para muitos católicos o fechamento das igrejas resultou também de um multi-secular processo anti-cristão
Outro exemplo é o das procissões de Semana Santa de 71 irmandades em Sevilha que reúnem centenas de milhares de católicos e curiosos. 

Elas foram totalmente interditadas pela Arquidiocese por segundo ano consecutivo com argumentos não de fé mas sanitários: evitar contágios e com os termos mais draconianos, conforme noticiou ACI Prensa.

Algo semelhante só aconteceu em 1933, durante uma onda de crimes de bandas esquerdistas da II República nas vésperas da sangrenta Guerra Civil 36-39.

O que devia ser a rememoração da Paixão, Morte e Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo, ficou parecendo da parte do clero e do povo com uma imensa manifestação de indiferença e insensibilidade, ou até um triunfo de Lutero sobre o Concílio de Trento.


quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

Santa Teresinha e a parábola do escritor Saint-Exupéry






O escritor e aviador francês Saint-Exupéry (1900-1944) descreve simbolicamente em seu livro Vol de Nuit (voo da noite) a situação da pessoa que, almejando colocar-se acima das misérias terrenas, procura com avidez alcançar o sublime. 

Vamos primeiro ao texto, que comentaremos depois.

Imagina ele um aviador de nome Fabien voando em meio a uma tormenta que parece arrastá-lo para o sorvedouro:

“E foi num momento destes que algumas estrelas brilharam sobre a sua cabeça, num rasgão da tempestade [...]. Sua fome de luz era tal, que Fabien subiu. [...]

Sofrera tanto em busca duma luz, que já não largaria mesmo a mais confusa. Sentindo-se afortunado com aquele pobre clarão, seria capaz de dar voltas, até cair morto, em torno daquele sinal do qual andava faminto. E ei-lo subindo até os campos de luz.

“Elevava-se pouco a pouco, em espiral, num poço que se abrira acima dele e se fechava debaixo dele. E à medida que subia, as nuvens iam perdendo a sua cor escura de lama, passavam a seu lado como vagas cada vez mais puras e brancas. Fabien emergiu.

“Foi imensa a sua surpresa, a claridade era tal que o ofuscava. Teve de fechar os olhos durante alguns segundos. Nunca imaginara que de noite as nuvens pudessem ofuscar. Mas a lua cheia e todas as constelações transformavam-nas em vagas deslumbrantes.

“No mesmo instante em que emergia, o avião recuperou subitamente a calma, uma calma que parecia extraordinária. Nenhuma onda o fazia inclinar-se.

Como um barco que transpõe o dique, entrava em águas reservadas. Encontrava-se num canto do céu ignorado e escondido, como a baía das ilhas bem-aventuradas.

Abaixo dele, a tempestade constituía um outro mundo de três mil metros de espessura, percorrido por rajadas, por trombas d’água, por relâmpagos, mas oferecia aos astros uma face de cristal e neve.

“Fabien tinha a sensação de ter chegado a limbos estranhos, pois tudo se tornava luminoso: as suas mãos, o seu vestuário, as suas asas. [...]

“Aquelas nuvens, abaixo dele, refletiam toda a neve que recebiam da lua. E também as da direita e da esquerda, altas como castelos. Corria um leite de luz, em que a tripulação se banhava. [...]

Mil braços obscuros o tinham largado. Tinham-se quebrado as cadeias, como as de um prisioneiro que deixam caminhar só, por um instante, entre flores. ‘Belo demais’, pensava Fabien, enquanto vagueava no meio de estrelas amontoadas como um tesouro” (Antoine Saint-Exupéry, Vol de Nuit, Gallimard, 1972).

* * *

O que dizer?

Esse sublime existe, e ele se reflete nas coisas que nos cercam.

Tudo o que existe de belo, verdadeiro e bom nesta Terra é reflexo de uma realidade superior, que Deus criou para os que O amam, e que encontraremos plenamente desabrochada no Céu.

Aqui na Terra, esses aspectos sublimes, que espelham a Deus, encontram-se misturados com o horrendo, o mau e o errado, por efeito do pecado original e dos pecados atuais dos homens, e também pela ação diabólica que a tudo quer corromper.

Pode haver épocas ou situações em que as semelhanças da sociedade terrestre com o Céu predominem, e outras em que os reflexos do Inferno nos flagelem, como a atual.

Mas em qualquer tempo existirão os dois mundos –– o do belo e o do horrendo –– muitas vezes mesclados.

Felizes aqueles que souberem distingui-los, para detestar o feio e admirar o belo. Mais ainda, para serem lutadores em favor do bem e da verdade, contra o mal e o erro.

Os que se encantam com a beleza, a verdade e o bem, onde quer que eles se encontrem, esses preparam suas almas para o Reino de Deus.

A mais acertada conclusão desta “visão” de Saint-Exupéry não nos é dada pela bela descrição simbólica que ele faz –– e que permanece no terreno meramente natural –mas sim pelo escrito singelo de Santa Teresinha do Menino Jesus: “Por cima das nuvens o céu é sempre azul”.

E para a carmelita de Lisieux, este céu que paira sobre as nuvens é o Céu dos Bem-aventurados.